Cantar, rimar, bater palmas. A infância está cheia de sons — e, afinal, isso pode ser mais importante do que pensamos. Vários estudos científicos têm vindo a revelar uma relação sólida entre a prática musical, sobretudo o canto regular, e o desenvolvimento da consciência fonológica nas crianças. Este é um daqueles casos em que o instinto dos educadores encontra agora respaldo empírico.
Ainda que o texto em questão não cite directamente o estudo da Universidade de Helsínquia (envolvendo 500 crianças dos 3 aos 6 anos), a evidência internacional converge: a musicalidade — com destaque para o canto — potencia competências essenciais à leitura, como a perceção e manipulação de sons, sílabas e rimas.
O que é afinal a consciência fonológica?
É, em termos simples, a capacidade de “ouvir por dentro” das palavras. Saber que cão começa com o som /k/, perceber que mala tem duas sílabas, ou identificar que casa e asa rimam. Esta consciência dos sons da língua, das suas estruturas e padrões, é uma das pedras basilares da aprendizagem da leitura e da escrita. Não é o único factor — mas é um dos mais consistentes preditores do sucesso escolar nesta fase.
E onde entra a música?
Ritmo, melodia e leitura — um trio inesperado
Estudos em crianças em idade pré-escolar e nos primeiros anos do 1.º ciclo mostram que competências musicais como o sentido rítmico ou a perceção de altura (pitch) estão fortemente associadas ao desenvolvimento da consciência fonológica.
Mais: o envolvimento regular em actividades musicais — e aqui o canto destaca-se — estimula a perceção auditiva, a memória verbal e a capacidade de discriminar sons semelhantes. Estas são precisamente as habilidades envolvidas na descodificação de palavras e na aprendizagem do princípio alfabético, ou seja, na correspondência entre sons e letras.
Ou seja, quando uma criança canta com regularidade, está — muitas vezes sem saber — a treinar as bases neurolinguísticas da leitura.
O canto como ferramenta pedagógica
A literatura científica sugere que o canto pode ser uma poderosa ferramenta pedagógica, acessível e de baixo custo, que favorece aprendizagens duradouras. Não se trata apenas de expor a criança à música, mas de envolvê-la activamente: cantar, repetir, criar rimas, explorar sons com o corpo e com a voz.
Estes exercícios musicais têm ainda uma outra vantagem: são, por natureza, lúdicos. O prazer que a criança retira da actividade torna a aprendizagem mais significativa — e isso tem impacto no envolvimento e na retenção.
E a evidência?
Ainda que o estudo específico da Universidade de Helsínquia não seja referido directamente nos resultados apresentados, os dados disponíveis na literatura internacional apontam claramente no mesmo sentido. Trabalhos desenvolvidos em contextos diversos — do Canadá à Finlândia, passando por Portugal — sustentam a ideia de que a prática musical regular tem efeitos positivos mensuráveis no desenvolvimento fonológico das crianças.
Mais ainda: programas de intervenção que integram música no currículo pré-escolar têm mostrado ganhos consistentes na consciência fonológica e na aprendizagem inicial da leitura, especialmente em contextos educativos com menos recursos.
Em síntese
A conclusão é clara — e entusiasmante: cantar regularmente não é só divertido. É, também, uma poderosa alavanca para aprender a ler.
Cabe agora aos educadores, escolas e decisores políticos olharem para a música como aliada do ensino da linguagem — e não como um “extra” facultativo. Porque, ao que tudo indica, quando a criança canta… a leitura começa a nascer.
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